Alguns episódios pitorescos ligados a esta máquina:
- A rifa premiada não foi comprada pelo meu Pai, foi-lhe oferecida.
- Uma vez, a máquina caiu ao Tejo e foi ao fundo na zona de embarque dos cacilheiros. Alguém mergulhou (!) e foi buscá-la. Secou-se, limpou-se e voltou a funcionar.
- Esta máquina já fotografou um morto. Tratou-se de um bébé, cuja única foto foi tirada a pedido da sua Mãe.
- Há pouco tempo vi uma máquina igual no mini-museu do Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa.
Em 1972, um amigo emprestou-me a sua "rangefinder", uma Yashica Electro 35 GT, com a qual a produtividade disparou !! Como o empréstimo era de longo prazo, o vício começou a crescer até ao ponto de não-retorno. De tal modo que, quando o amigo pediu a máquina de volta, cerca de ano e meio depois, já era tarde para voltar para a Kodak Baby Brownie.
Em 1974 (no dia em que o General Spínola tomou posse como Presidente da República) comprei a minha máquina fotográfica: uma Nikon F Photomic, na altura a melhor reflex 35mm do mercado e para alguns a melhor máquina fotográfica de sempre !!! Ainda a tenho e ainda hoje seria perfeitamente capaz de tirar boas fotos (as pilhas do fotómetro nunca necessitaram de ser mudadas e ainda estão boas).A reboque da máquina fotográfica e ao longo dos anos veio toda a parafernália que estava associada à fotografia "do antigamente": objectivas wide-angle (Nikon 20 e 28mm), normal (Nikon 50 e 55mm macro), short-tele (Nikon 105mm), zoom (Vivitar 70-210), flash (Vivitar 283), fotómetro de mão (Lunasix 3), fole para cópia 1:1 (Vivitar bellows + lente Schneider 100mm), tripés, filtros, ... tudo dentro de uma mala de alumínio que, cheia, pesava mais de 10 quilos (ainda tenho praticamente tudo).
De facto, o saco de transporte com o "essencial" para a minha actividade de campo pesava cerca de 8 quilos, fora o tripé. Foi neste preparo que captei imagens de todas as viagens que fiz nos anos 70 e 80 do século passado.
Na altura, fotografava cerca de 1 rolo de 40 imagens por dia (!!) o que, apesar de tudo, constituía uma despesa relevante para um estudante universitário. Para minimizar o rombo no orçamento, comprava o filme em bobines de 30m (Kodak Tri-X ou Ilford HP5) que depois eu cortava e montava nos rolos. Por maioria de razão, comecei a revelar os filmes em casa.
Com mais algum investimento (muito !) iniciei o processamento do papel. Virando os bolsos ao contrário, comprei um ampliador (primeiro um Meopta e mais tarde um glorioso Leitz Focomat IIc com lentes Zeiss) ao qual se seguiu toda a "tralha" associada: tanques, tinas, esmaltadeiras, fotómetro, lâmpadas.
Começaram aí as noites mal-dormidas (laboratório até às 4 da manhã, universidade às 8 e meia).
Com o gosto que eu tinha pela actividade e os meus conhecimentos de Química rapidamente evoluí para voos mais altos e entrei na experimentação (processamentos especiais, recuperação de técnicas antigas, etc.) A minha biblioteca e o meu laboratório caseiro de produtos químicos crescera desmesuradamente, como se pode imaginar.
E assim correu o tempo, até 1985. Nessa altura, era este o meu equipamento (não contando com os químicos necessários para o processamento nem com o "material pesado": bancadas, armários, tinas de lavagem, esmaltadeira, ...):
No início dos anos 80 ocorreu uma pequena "revolução, com o aparecimento das "rangefinders" com foco automático e avanço motorizado do filme, tudo muito prático nos tempos que corriam. A ponto de, ao longo da década, ter adquirido uma Canon AF35M (que mais tarde perdi...) e uma Nikon L35AF.
Em 1985 nasceu o meu Filho. E em 1986 a minha Mulher lançou-me o ultimato: "fora com o laboratório, quero a segunda casa-de-banho de volta". Vendi todo o laboratório (prateleiras, equipamentos, químicos e livros) por 100 "contos" (500 Euros).
A partir daí restringi-me aos diapositivos, que iniciara em 1978, e mantive a veia fotográfica até final dos anos 80, quando comprei a minha primeira câmara de vídeo.
A Fotografia foi relegada para segundo plano e, com o advento do vídeo (e sucessivas trocas de câmara) os filmes resultantes foram sendo cada vez mais satisfatórios. O software de edição de vídeo também começava timidamente a despontar.
A pouco e pouco, a minha Nikon F, injustamente obsoleta, já não dava conta do recado e já pesava mais do que a câmara de vídeo.
No final dos anos 90 ainda comprei uma Nikon F60 com auto-foco, mas já era tarde demais para a Fotografia Analógica.
A Fotografia Digital invadiu tudo (e o vídeo digital também). O aparecimento de máquinas com funcionalidades impensáveis e de software capaz de manipular os resultados até ao limite alteraram todos os conceitos tradicionalmente associados à Fotografia.
Também eu me deixei arrastar. Primeiro comprei uma Sony DSC-F77 (4.0 MPix) e mais tarde uma Casio Exilim EX-Z1200 (12.1 MPix) que em 3 anos de vida fez 23000 fotos.
E como umas coisas puxam outras, também "anda lá por casa" uma Nikon Coolpix L22 (12.0 MPix), que de vez em quando dá um ar da sua graça.
Mas a aquisição mais recente (Natal de 2011) foi uma Canon Powershot SX230HS (12.1 MPix CMOS), cuja característica mais relevante é o seu competente zoom óptico de 14x.
Com a mudança de hábitos e o turbilhão tecnológico, a norma passou a ser uma média de 700~900 imagens/mês. Curiosamente, no auge da minha "aventura analógica" fazia 1 rolo/dia o que, em rigor, seria algo como 1100 imagens/mês...
Mas isto já não é a mesma coisa !!! Não há nada que se compare ao velho prazer do analógico ... e de todos, não há nada como o preto-e-branco !!!
"Carregar no botão" e não saber se tinha ficado bem ... ter de fotografar todas as 36 imagens do rolo, revelá-lo e só então ter uma idéia do potencial das imagens. Fazer provas de contacto. Estudar e planear o que fazer com cada imagem. Ampliar. Fazer provas de teste. Mascarar a luz do ampliador. Dosear a composição dos banhos e o tempo de tratamento. E, no fim, se tudo corresse bem, obter uma imagem, única e irrepetível, que valia cada minuto que tivéssemos consumido a produzi-la. E se quiséssemos repetir o processo nunca iria dar igual resultado (até poderia ser melhor, mas nunca igual).
Claro que, para situações realmente especiais, o detalhe começava logo com a captação da imagem (filtros, etc.) e com o próprio tipo de filme (infra-vermelho, "tungsténio", alto contraste, grão fino, alta sensibilidade, ...)
(Já nem falo aqui, por estar fora do contexto, da ocasião em que entendi lançar-me na revelação e ampliação a cores. Ficará para mais tarde).
A Fotografia a preto-e-branco é a manifestação mais nobre da 8ª Arte. Uma imagem vale por si, pelo que contém e pelo que comunica. Todos os elementos acessórios são expurgados (começando pela cor) a ponto de não se sentir a sua falta.
Ressalva:
Em abono da verdade, convenhamos que uma imagem analógica a preto e branco nunca tem só "preto" e "branco" (e/ou gamas de "cinzento"). A riqueza e profundidade destas imagens mede-se também pelo subtil jogo de tonalidades e texturas que o "grão" do negativo pode apresentar, bem como a sua consequência na imagem final em papel. A "côr do grão" do papel depende da sua marca, tipo, graduação (contraste) e formulação dos banhos de processamento. A grande riqueza de uma imagem a preto e branco está precisamente na subtileza que essas nuances podem apresentar.
Por vezes é o próprio pós-processamento que se encarrega de acrescentar côr à imagem final. Tendo em conta que as tonalidades finais da imagem são propositadas e que, quer o "branco" (mistura de todas as cores) quer o "preto" (ausência de côr), são meras abstracções teóricas que a fotografia tenta captar melhor ou pior, todas as variantes acima enunciadas continuam aqui a considerar-se "imagens a preto e branco".
Veja-se a este propósito a excelente trilogia de livros de Ansel Adams: "The Camera", The Negative", "The Print".
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